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Dirigentes de Consórcios Públicos e Desincompatibilização

A cada quatro anos volta à cena a discussão sobre a obrigatoriedade de desincompatibilização dos prefeitos que compõem as diretorias e conselhos fiscais dos consórcios públicos intermunicipais para que não incorram em inelegibilidade. Há anos defendemos o entendimento segundo o qual essa desincompatibilização é absurda, um contrassenso, no mínimo, tendo-se em vista que para ser dirigente de consórcio público, faz-se necessário que a pessoa seja chefe do Poder Executivo.

Assim, como o prefeito não precisa desincompatibilizar-se do cargo de prefeito para candidatar-se à reeleição, por silogismo e lógica, também não necessitaria se afastar da direção do consórcio público para ter deferido o seu pedido de registro de candidatura.

O Tribunal Superior Eleitoral tem entendimentos que navegam nesse sentido, conforme os dois casos colacionados abaixo, um do ano de 2008 e outro de 2012, “in verbis”: 

1.Os consórcios públicos intermunicipais são instrumentos de cooperação entre governos municipais de uma determinada região que, com conjugação de esforços, buscam a realização de objetivos de interesse público comum das municipalidades participantes, mediante a distribuição de atribuições e responsabilidades entre os níveis governamentais.

2. O consórcio público, como é de sua essência, planeja, gere e executa políticas públicas que lhe foram outorgadas pelas municipalidades, realizando, assim, funções típicas do Poder Público municipal. A atuação do prefeito no consórcio intermunicipal nada mais é do que o desdobramento do exercício de atos de gestão próprios do Chefe do Poder Executivo.

3.Nesse contexto, não há falar em obrigatoriedade de desincompatibilização do agravante, candidato à reeleição ao cargo de prefeito, do cargo exercido no Conselho Fiscal de consórcio intermunicipal.

4. Agravo regimental provido”(TSE, Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n.º 30.036, de 2.12.2008, Rel. Min. Fernando Gonçalves). “Registro. Desincompatibilização. 1. Prefeito candidato à reeleição não precisa desincompatibilizar-se do cargo de presidente de consórcio público intermunicipal. 2. Se o candidato já exerce o cargo de Chefe do Poder ExecutivoMunicipal e a ele é permitida a candidatura à reeleição, nos termos da Emenda Constitucional nº 16/1997, não se afigura razoável aplicar, no caso, a causa de inelegibilidade prevista no art. 1º, inciso II, alínea a, item 9, da Lei Complementar nº 64/90,pois não faria sentido exigir-se do candidato a desincompatibilização do cargo que ocupa em razão do mandato eletivo por ele exercido. Recurso especial não provido”(Recurso Especial Eleitoral nº 31655, Acórdão, Relator(a) Min. Arnaldo Versiani, Publicação:  PSESS - Publicado em Sessão, Data 04/10/2012).

No entanto, existe manifestação do Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso, quando respondeu a uma consulta formulada em 2008, estabelecendo a necessidade de desincompatibilização dos prefeitos dos cargos de direção dos consórcios públicos dos quais façam parte. Tudo leva a crer que tal posicionamento da Justiça Eleitoral de Mato Grosso seja alterado na apreciação do caso concreto, pois revela-se em descompasso com o direito administrativo moderno que tem nos consórcios públicos um relevante e já indispensável instrumento de gestão pública, sobretudo em âmbito municipal, figurando como uma extensão de cada Municipalidade.

Ora, se tais consórcios públicos intermunicipais não podem ser administrados por outra pessoa que não seja o prefeito de um dos entes consorciados, é cabível a aplicação do princípio de “quem pode o mais pode o menos”, ou seja, se para ser candidato à reeleição ao cargo de prefeito não existe a necessidade do afastamento da função de prefeito, não há que se falar em afastamento das funções de direção dos consórcios públicos, porquanto tais cargos de direção somente podem ser ocupados por prefeitos.

Ademais, o fato de eventualmente o prefeito continuar na direção do consórcio público intermunicipal não traz prejuízo algum ao equilíbrio de oportunidades no pleito na sua respectiva circunscrição eleitoral, ao passo que a descontinuidade da gestão de cada consórcio público poderia sim, ao menos em tese, ser prejudicial ao interesse público, considerando-se, inclusive, todo o cuidado existente nas transições de governo e a necessidade de observância de uma enorme quantidade de leis no nosso sistema ainda tão burocrático.

Ainda vale considerar que em muitos consórcios intermunicipais todos, ou quase todos, os prefeitos dos municípios consorciados têm direito à reeleição, de modo que a hipotética e indesejada desincompatibilização demandaria a realização de nova eleição interna, com toda a formalidade e o cumprimento dos prazos regimentais e legais.

Destarte, em homenagem aos princípios da razoabilidade, da continuidade do serviço público, da eficiência, e daquele quem afirma que “quem pode o mais pode o menos”, conquanto os julgados do TSE não tenham efeito vinculante, mas apontem para o bom senso jurídico, nosso entendimento, salvo melhor juízo, é no sentido de que os prefeitos que estejam ocupando cargos de direção ou de conselho fiscal junto aos consórcios públicos intermunicipais, e que queiram se candidatar novamente ao cargo de prefeitos, não necessitam se desincompatibilizar das respectivas funções de conselheiro ou dirigente na estrutura administrativa do consórcio público a que esteja vinculado por força de lei municipal.


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