1. A Administração Pública Federal não está obrigada a promover prévio procedimento licitatório destinado a contratação de instituição financeira oficial para, em caráter exclusivo, prestar serviços de pagamento de remuneração de servidores ativos, inativos e pensionistas e outros serviços similares, podendo optar por efetuar a contratação direta com fundamento no art. 37, inciso XXI (primeira parte), da Constituição Federal, c/c o art. 24, inciso VIII, da Lei 8.666/93, hipótese em que deverá cumprir as exigências estabelecidas no art. 26 da Lei 8.666/93, apresentando os motivos da escolha do prestador de serviços e a justificativa do preço.
Consulta formulada pelo então Presidente da Câmara dos Deputados questionara a juridicidade da contratação de instituição financeira oficial para a prestação, em caráter exclusivo, de serviços de gestão financeira da folha de pagamento de servidores públicos ativos, inativos e pensionistas da Administração Pública Federal e de outros pagamentos correlatos.
Especificamente, o consulente perguntara se o gestor público estaria obrigado a realizar licitação para a "concessão de exclusividade" às instituições financeiras oficiais para a prestação dos serviços de pagamento de remuneração e similares; e, ainda, se seria viável a contratação direta de banco oficial com amparo no art. 24, inciso VIII, da Lei 8.666/93.
Em juízo de mérito, o relator inicialmente apresentou uma análise da natureza jurídica da atividade em questão, destacando que a folha de pagamento dos servidores públicos "constitui-se em subproduto da atividade de gestão da Administração Pública, cujo valor pode ser aferível monetariamente e transformado em receita para a Administração", situação similar às folhas de pagamento de empresas privadas, "cujo montante é uma derivada da sua atividade econômica, sendo livremente negociada pela empresa, normalmente em prol da rentabilidade de seus negócios, ou em benefício dos titulares das contas creditadas".
Acrescentou o relator que a elaboração da folha de pagamento constitui "mera ação administrativa, com caracteres nitidamente operacionais, secundários, não-finalísticos, com o conteúdo de atividade meio do Estado, por não estar vinculada à prestação de serviço público ou ao interesse primário da sociedade".
Nesse contexto, tal atividade, "que movimenta recursos vultosos, decorrentes da prestação da atividade estatal por agentes públicos", seria capaz de "agregar valor ao serviço e atrair o interesse de instituições financeiras, com possibilidade de competição", de forma similar às atividades tipicamente terceirizáveis pela Administração (copeiragem, segurança e manutenção predial).
Para o relator, seria possível enquadrar o serviço em questão como atividade bancária ordinária, "com potencial de aproveitamento econômico indireto, tanto para a Administração, quanto para a entidade bancária, ante a possibilidade da ampliação da carteira de clientes da instituição contratada".
Nesse sentido, destacou o "amplo leque de possíveis prestadores de serviço no segmento mercadológico", concluindo que o contrato administrativo seria instrumento jurídico adequado para regular as relações entre o Estado e o terceiro para execução do objeto em análise, devendo a sua celebração ser obrigatoriamente precedida de procedimento licitatório, nos termos do art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, excepcionado apenas por hipóteses específicas prevista em lei.
Sobre a possibilidade jurídica de a Administração Federal realizar a contratação direta de instituição financeira oficial para a prestação, em caráter exclusivo, de serviços de pagamento de servidor público, observou o relator que está fundamentada no art. 24, inciso VIII, da Lei 8.666/93, uma vez que essas entidades bancárias são anteriores à edição da Lei, além do que elas atuam, imemorialmente, na prestação de serviços de suporte à Administração Pública, mesmo quando o potencial econômico das folhas de pagamento era desprezado pelo setor bancário privado.
Dessa forma, aduziu o relator, a prestação dos serviços em questão caracteriza-se "tanto como atividade econômica, como atividade de nítido suporte à Administração", podendo ser licitada a juízo de conveniência e oportunidade da Administração, "que deverá optar entre a realização do amplo procedimento ou a dispensa autorizada pelo art. 24, VIII, da Lei 8.666/1993".
Endossando o parecer do Ministério Público, registrou o relator não trazer, "no contexto da realidade vigente", prejuízo ao regime concorrencial previsto no art. 173, § 1º, da Constituição Federal a contratação direta, com fundamento no art. 24, inciso VIII, da Lei 8.666/93, uma vez que, embora o procedimento licitatório seja constitucionalmente exigível, "as instituições privadas por vezes não têm manifestado interesse na prestação de serviços de gerenciamento financeiro da folha do funcionalismo público, como comprova notícia de licitações desertas, promovidas pela Administração, trazidas pela autoridade consulente".
Assim, propôs o relator responder ao consulente que:
a)"A Administração Pública Federal não está obrigada a promover prévio procedimento licitatório destinado a realizar a contratação de instituição financeira oficial para, em caráter exclusivo, prestar serviços de pagamento de remuneração de servidores ativos, inativos e pensionistas e serviços similares, podendo optar por efetuar a contratação direta com fundamento no artigo 37, inciso XXI (primeira parte), da Constituição Federal, c/c o artigo 24, inciso VIII, da Lei 8.666/1993, desde que demonstrados os benefícios para a Administração, em relação à adoção do procedimento licitatório;
b)Havendo interesse, a Administração Pública Federal pode promover o prévio procedimento licitatório, para contratação da prestação de serviços, em caráter exclusivo, de pagamento de remuneração de servidores ativos, inativos e pensionistas e outros serviços similares, devendo franquear a participação no certame de instituições financeiras públicas e privadas, em cumprimento aos princípios da legalidade, da isonomia, da moralidade da impessoalidade, da publicidade e da eficiência, previstos no caput do artigo 37 da Constituição, bem assim da seleção da proposta mais vantajosa para a Administração e dos outros princípios estampados no artigo 3º da Lei 8.666/1993".
Sobre a viabilidade da contratação direta de banco oficial, o relator propôs informar ao consulente que "é viável a contratação direta de instituição financeira oficial, com fundamento no artigo 24, inciso VIII, da Lei 8.666/1993, para a prestação de serviço, em caráter exclusivo, de pagamento de remuneração de servidores ativos, inativos e pensionistas e outros serviços similares, devendo, ainda, serem observadas as condições de validade do ato administrativo estabelecidas no artigo 26, caput, e parágrafo único, do referido diploma legal, bem como demonstrada a vantagem da contratação direta em relação à adoção do procedimento licitatório".
Acolhendo a proposta do relator, o Plenário conheceu da Consulta, respondendo ao consulente nos termos propostos no voto. Acórdão 1940/2015-Plenário, TC 033.466/2013-0, relator Ministro Walton Alencar Rodrigues, 5.8.2015.
2. A delegação a terceiros da prestação de serviços, em caráter exclusivo, de pagamento de remuneração de servidores ativos, inativos e pensionistas e outros serviços similares deve ser instrumentalizada por meio de contrato administrativo, não se admitindo a utilização de convênios ou instrumentos similares, haja vista a ausência, no objeto da relação jurídica, de interesses recíprocos e de regime de mútua cooperação.
Ainda na Consulta acerca da juridicidade da contratação de instituição financeira oficial para a prestação, em caráter exclusivo, de serviços de gestão financeira da folha de pagamento de servidores públicos ativos, inativos e pensionistas da Administração Pública Federal, o consulente indagara sobre o instrumento jurídico adequado para se proceder à contratação da entidade (contrato ou convênio).
Sobre o ponto, o relator ressaltou "a nítida existência de interesses e obrigações contrapostos" na relação estabelecida entre a Administração e as entidades bancárias, destacando que, "por um lado, a Administração procura tornar mais eficiente a gestão financeira da folha de pagamento de pessoal, bem como o pagamento a fornecedores, pela via da transferência dessa atividade operacional a terceiro", e, por outro lado, o ente privado busca "obter o retorno adequado, derivado da exploração econômica da gestão financeira da folha de pagamento de funcionários públicos e demais serviços similares".
Considerando que os interesses da Administração e os das entidades bancárias são diversos e contrapostos, aduziu o relator que tal vínculo jurídico não se amoldaria "às condições necessárias para utilização de convênio ou instrumento congênere, tal qual definido no artigo 1º, § 1º, inciso I, do Decreto 6.170/2007, com redação dada pelo Decreto 8.180/2013".
Nesse sentido, concluiu que o contrato administrativo seria a única forma "juridicamente adequada para instrumentalizar a terceirização da atividade de gestão de folha de pagamento de servidores e serviços similares", salientando por fim que o próprio TCU, em diversas deliberações," já determinou aos órgãos e entidades da Administração Federal a utilização de contrato como o instrumento correto para regular a prestação dos serviços de gestão financeira de pagamentos de funcionários e a terceiros", a exemplo dos Acórdãos 3042/2008-Plenário, 1457/2009-Plenário e 1952/2011-Plenário.
Acolhendo a proposta do relator, o Plenário conheceu da Consulta para responder, no ponto, à autoridade consulente que "a delegação a terceiros da prestação de serviços, em caráter exclusivo, de pagamento de remuneração de servidores ativos, inativos e pensionistas e outros serviços similares deve ser instrumentalizada por meio de contrato administrativo, haja vista a ausência, no objeto da relação jurídica, de interesses recíprocos e de regime de mútua cooperação". Acórdão 1940/2015-Plenário, TC 033.466/2013-0, relator Ministro Walton Alencar Rodrigues, 5.8.2015.
3. Havendo interesse de a Administração Pública Federal promover prévio procedimento licitatório para contratação de prestação de serviços, em caráter exclusivo, de pagamento de remuneração de servidores ativos, inativos e pensionistas e outros serviços similares, com a previsão de contraprestação pecuniária por parte da contratada, deverá a contratante, além de franquear acesso ao certame tanto às instituições financeiras públicas como às privadas, adotar a modalidade pregão (Lei 10.520/2001), preferencialmente sob forma eletrônica, tendo por base critério de "maior preço", em homenagem ao princípio da eficiência e da seleção proposta mais vantajosa para a Administração Pública.
Também na Consulta acerca da juridicidade da contratação de instituição financeira oficial para a prestação, em caráter exclusivo, de serviços de gestão financeira da folha de pagamento de servidores públicos ativos, inativos e pensionistas da Administração Pública Federal, o relator apresentou considerações acerca da modalidade licitatória apropriada à hipótese de contratação em exame.
Sobre a questão, relembrou o relator o Acórdão 3042/2008-Plenário, por meio do qual o Tribunal firmara entendimento de que:
i) "o direito de um ente público, no caso o INSS, de contratar instituições financeiras para prestar serviços financeiros necessários à consecução de suas atividades de autoadministração (...), como a da folha de pagamentos previdenciários, pode ser considerado um ativo especial intangível e, nesta condição, pode ser ofertada sua exploração econômico-financeira ao mercado, por meio de licitação";
ii) "a adoção de critério de julgamento de propostas não previsto na legislação do Pregão, do tipo maior valor ofertado para o objeto mencionado (...), somente seria admissível, em princípio, em caráter excepcional, tendo em vista o relevante interesse público da aplicação deste critério alternativo para o atingimento dos objetivos institucionais do ente público e como mecanismo concretizador do princípio licitatório da seleção da oferta mais vantajosa para a Administração".
Diante do exposto, considerou o relator que a mesma modalidade de procedimento licitatório deveria ser adotada na situação em tela, na hipótese de a Administração optar pela licitação, uma vez que, sendo "os serviços bancários tendentes à operação da folha de pagamento, cujos padrões de desempenho e qualidade poder-se-iam objetivamente definir em edital, por meio de especificações usuais de mercado, haver-se-ia de considerá-los serviços comuns, atendendo-se às condições necessárias para realização do Pregão, como prevê o artigo 1º, § único, da Lei 10.520/2002".
Acrescentou ainda que "a atividade bancária é inteiramente regulada por normas específicas expedidas pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Banco Central do Brasil, amplamente conhecidas no mercado financeiro, tornando ainda mais factível o estabelecimento de padrões contratuais".
Quanto ao critério de julgamento, observou o relator que a Lei 10.520/02 estabelece que o julgamento e a classificação das propostas serão realizados pelo "menor preço". Contudo, ressaltou que, a despeito da ausência de expressa previsão legal, a adoção do critério "maior preço", acatada pelo Tribunal em situação similar ao caso em exame, "não fere a mens legis, os princípios reitores da licitação pública e a vedação estampados nos artigos 3º e 22, § 8º, da Lei 8.666/1993, aplicável subsidiariamente à modalidade Pregão por força do artigo 9º da Lei 10.520/2002", uma vez que "privilegia a busca da finalidade constitucional da proposta mais vantajosa para a Administração".
Além disso, "não afeta a isonomia entre licitantes, uma vez estabelecidas no edital todas as condições objetivas para habilitação e julgamento das propostas", e não viola a "proibição normativa que veda a criação modalidade licitatória não prevista em lei, porquanto o Pregão é preservado como procedimento adequado à contratação dos serviços.
Por fim, não se está a desvirtuar o pregão, convertendo-o em espécie de leilão, pois o objeto do contrato é a prestação de serviços comuns, não se confundindo com a alienação de bens ou a sua exploração por terceiros".
Nesse contexto, o relator concluiu que, sendo o pregão "a modalidade adequada para contratação do objeto em análise (...), reputa-se que a forma eletrônica deve ser preferencialmente utilizada, consoante determina o artigo 4º, § 1º, do Decreto 5.450/2005".
O Plenário do Tribunal conheceu da Consulta para responder, no ponto, à autoridade consulente que "havendo interesse de a Administração Pública Federal promover prévio procedimento licitatório para contratação de prestação de serviços, em caráter exclusivo, de pagamento de remuneração de servidores ativos, inativos e pensionistas e outros serviços similares, com a previsão de contraprestação pecuniária por parte da contratada, deverá a contratante, além de franquear acesso ao certame tanto das instituições financeiras públicas como das privadas, adotar as seguintes medidas: (...); b) realizar licitação na modalidade pregão, prevista na Lei 10.520/2001, preferencialmente sob forma eletrônica, conforme exige o artigo 4º, § 1º, do Decreto 5.450/2005, tendo por base critério 'maior preço', em homenagem ao princípio da eficiência, insculpido no caput do artigo 37 da Constituição Federal e da seleção proposta mais vantajosa para a Administração Pública, inserto no caput do artigo 3º da Lei 8.666/1993".
Acórdão 1940/2015-Plenário, TC 033.466/2013-0, relator Ministro Walton Alencar Rodrigues, 5.8.2015.